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sábado, 25 de agosto de 2018

artea
arte de Regina Silveira
(com licença e reverência)

algumas escadas

descer escadas
com passos ágeis
nem lentos nem velozes
ao contrário deliciando-nos
desacelerar o pulsar da pulsão
ouvir o acorde de tristão caído
no chão sintético do lugar
evocar a serena dor em dó
sereníssima partitura sopra
instrumentos evanescentes

alice caiu por alegoria
hamlet por obsessão
eu e talvez você ou não
por excesso de realidade
é noite profunda propícia
para o excesso de pranto
lamento em sustenido
de madeira e mármore
de memória membrana
escadas que levam à torre

torre dos sinos de bronze
escadas a subir sem saber
degraus espiralados 
de sentido e destinação
escamas da estrelada Cy
mundo membrana move
ao modernismo tropical
escadas de babilônia babel
escadas da biblioteca viva
de Alexandria incendiada


quinta-feira, 9 de agosto de 2018


obra de Nuno Ramos (com licença)

vulgaridades


bate-papo em salões frios de arte
todo um cerimonial insuportável
e tosco tangendo o artista da vez

outra
coreografia do boteco de homens
mulheres na companhia dos maridos
e as conversas de gestos desaforados

a vulgaridade inseminada na terra
contra os palestinos predestinados
ao fim do fundo fornalha da forja

pegar o ônibus errado e perder-se
nas ruas escuras de um bairro feio
igrejas bares abertos e noite praga

a insistência dos vulgares em vãos
instalados na cúpula de poderosos
esquemas indícios armam cretinice

hipócritas vibram na vitória do aborto
logo seus mantenedores inseminadores
logo os que matam crianças em creches

as infindáveis fotos das apurações à toa
do filme de juízes de ministérios de mer
da de auxílio moradia palácios farsantes

o fedor da estação de tratamento d’água
passando por árvores telhados e janelas
nas horas inesperadas da cidade fúnebre

a categoria filme mais popular no oscar
que vende franquias líderes de bilheteria
quando o cinema passa longe de roliúde

a novela fixada em fixações de folhetim
mais alucinado e absurdo que o teatro
de costumes mais retrógrado na ficção

o vizinho que se aproxima do portão 
portando discurso que ouviu disperso
e fazendo de suas as palavras tortas

bancadas da bala da bíblia do boi
escolhidos farsantes povo prascóvio
vergonha nação ê bumba ê ê ê bão  

vulgaridade é suportar a mim mesmo
contigo fingindo ser antropófago cool
um sujeito bacana saído do sarcófago        

vulgaridade é não dar fim ao acabado
que não interessa mais pois amanhã
renasceremos para o desafio+vulgar
   

segunda-feira, 6 de agosto de 2018



arte de Mike Stilkey no site pensamentosvalemouro

o sono do livro


face do livro

ouvidos e olhos

letras sangradas

plena página de sol

segredos do sonhar

sons incessantes

é feito bodoque

lançando pedras

florestas e gonzo

de aves animais e

insetos angelicais

martelando silêncio


o livro me encara

sopra pátinas e tempo

o mundo não precisa

de mim eu não preciso

de capa nem gps pessoal 

mergulha tu no fundo

do abismo baudelaire

que nem suporto saber

do céu ou inferno a querer

perseguir há dias e noites

essa turva leitura de flores

esses solícitos buquês de amor


o livro sofre por não estar escrito

o livro geme em sua encadernação

a repetições cansativas e curiosas

em configuração de respiração ofega

no teclado cego desta noite eterna

pois sem sentido sem história sem luz

está repreendido de suplícios insanos

semeando palavras demolidas de verbo

desmoronando em ruídos retumbantes

da própria escritura onírica apagando-se

em ondas extasiantes suspensão no ar

em câmeras drones cadernos cadeado