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sábado, 13 de junho de 2015


criatura/?/foto de Tayla Lorrana


um sujeito

por que esse espanto
com os espasmos horripilantes
das horas por que retrocedes
somos invenções
sujeitos à histeria histórica
subjetivações da sede e da fome
fabricados contratados
produzidos embalados
abram a caixa de ferramentas
o que é: esta é a palavra de ordem
abre a caixa de ferramentas
e exclamas palavras de rancor   

sem vírgula
em minha mesa de beber
a mesa é do bar
a cerveja é transgênica
não há companhia
a não ser o meu 
fantasma diário
em mim instalado
assim a contenda
está toda cercada
e eu liberado pra pensar

tapes gravados
emcâmaras de segurançardente
e inseguro me inscrevo
aos poucos sorvendo
o que se derrama, escamas do céu
sem solenidade glamur nem escarcéu
preencho o edital do tempo
contemporizo calado e na cabeça
raros gritos sonoros
de um pássaro de sapatos
de um par de ímpares impasses
em estado de samba que aceita tudo. 

a noite se dissolve total



sábado, 6 de junho de 2015


a lingua apunhalada/lygia pape


chegando em casa


1. do portão baixo da casa em que moro
e próximo do asfalto esparramado ouro
vejo três meninas de camisetas pretas
uma delas baila alçando-se para o abacateiro
outra cantarola para o meio fio da língua
e a terceira se desloca debaixo da sombra
avanço, paro e pergunto: vocês são artistas?
elas não “ouvem”.  oi garotas, boa noite/
uma delas acende uma célula do aparelho e
sussurra para outra algo como se de mim falasse.
elas vão se afastando, lentamente, com suas camisetas
e ainda elevo a voz para insistiexistir:
vocês não querem falar? somem nas proximidades
somem nas sombras do conjunto -
vocês são músicas, não são?
aí então inútil comunicação ridícula/.
gemo por dentro como o avião que
come o céu com seus motores./
a noite é de lua cheia/
2. passam logo em seguida -
neste caso, do ponto de vista do interior
da janela da sala iluminada em que
estou esparramado por dentro e armado
contra os cachorros do canil urbano,
próprios fotografamas instagrans/
passam garotos a pé e de bicicleta
cinco todos, braços carregando placas
brancas, cubos em mdf, como objetos
que lembram os desdobráveis da lygia/.../
3. da lygia clark e ”ou” da lygia pape?
as duas me confundem e elas mesmas
se confundem e não posso fazer nada
por isso (?) elas que resolvam a dupla onda
identidade por mim paginada nesta ode não
lygia clark diz e pode dizer
de poro a poro de pelo a pelo de suor a suor
modulada superfície de alguns nós.
latidos e caminhões do lixo explicito...?...
ôpa, os bichos de metal são de lygia clark
(BH-1920 – RJ-1988).
clark é sujeita sensorial, ok ? /
a lygia pape  (RJ - 1927-2004)
fiou os tecidos na madeira
e em lances livros relances
entrepenetráveis divisores
para que se posse dizer: eat me.
olhe aqui, coma-me, abisme-se-em-mim.
minha tinta é atingida da boca pra fora.
neste jogo da noite e seus latidos afora
se prolonga o narrador de futebol na tevê semsom.
a casa 55 é o casulo.ilusão que posso habitar agora.
lua cheia, hora de bolas paradas, suspensão.